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Essequibo: disputa territorial entre Venezuela e Guiana. Parte IV: algumas reflexões.


Figura disponível em https://www.correiobraziliense.com.br/mundo/2023/12/6665827-maduro-divulga-mapa-da-venezuela-com-incorporacao-de-essequibo.html

A atual tensão entre a Venezuela e a Guiana, pela disputa territorial de Essequibo, tem impactado na América do Sul, trazendo instabilidade para uma região que, até pouco tempo, era considerada como pacífica.

Nesse sentido, essa questão começou a ser debatida na Corte Internacional de Justica, bem como no Conselho de Segurança das Nações Unidas, demonstrando que a Comunidade Internacional está acompanhando o desenrolar dos acontecimentos e preocupada com uma possível escalada da crise.

Entretanto, como o Blog vem, desde a sua criação em 2020, acompanhando a questão venezuelana, era previsível que o regime de Maduro criaria uma instabilidade na região sul-americana, pois quando realiza-se uma revisão das análises dos nossos artigos sobre o tema, pode-se concluir que seria somente uma questão de tempo.

Logo, a cada um deles, tínhamos a preocupação de fazer alertas sobre as possíveis crises que poderiam surgir. Assim, selecionamos alguns desses artigos, com os seus respectivos resumos, para nos ajudar a tecer algumas considerações:


  1. "O problema venezuelano e os seus impactos e impasses geopolíticos", de 13 de abril de 2020, disponível em https://www.atitoxavier.com/post/o-problema-venezuelano-e-os-seus-impactos-e-impasses-geopolíticos, afirmamos que o regime do presidente Maduro, da Venezuela, que é uma ditadura de esquerda, se transformou num problema geopolítico para o continente sulamericano e para os EUA, bem como falamos que ele buscou ajuda militar, política e econômica junto a Rússia e a China em troca de fornecimento de petróleo e a da continuidade do pagamento das dívidas com esses países. Além desses, conseguiu apoio do Irã e da Turquia, e lógico não podemos nos esquecer de Cuba o que estava apoiando anteriormente. Assim, dissemos que a Venezuela se tornou uma boa oportunidade para os países que não possuiam boas relações com os EUA darem-lhe um "troco geopolítico", porque o país está dentro da área de influência estadunidense, se transformando numa "nova Cuba". Ademais, já nesta época, falamos que isso fazia com que o Brasil tivesse a sua política externa na região esvaziada, bem como o seu protagonismo no continente, além da diminuição da sua liderança regional, bem como lembrávamos que a Venezuela possuia uma área em litígio com a Guiana, e que poderia utilizar esse pretexto como "cortina de fumaça";

  2. "Essequibo: disputa territorial entre Venezuela e Guiana - possíveis impactos para o Brasil", de 19 de outubro de 2020, acessível em https://www.atitoxavier.com/post/essequibo-disputa-territorial-entre-venezuela-e-guiana-possíveis-impactos-para-o-brasil, fizemos várias análises e apresentamos as causas da atual crise. Assim, em 2020, falamos que não era interesse do governo venezuelano que houvesse a exploração de petróleo por empresas estadunidenses na área marítima adjacente à região do Essequibo, pois uma maior proximidade da Guiana com os EUA seria sempre vista como uma ameaça ao governo Maduro, tanto militar quanto economicamente. Além disso, afirmamos que era pouco provável que acontecesse uma invasão terrestre por parte da Venezuela. Porém, afirmamos que o governo de Caracas tentaria diplomaticamente, bem como poderia empregar a sua marinha (como já o fez), para impedir ou dificultar a exploração comercial do petróleo, isso poderá elevar a tensão entre a Venezuela e os EUA. Logo, concluímos que uma escalada na crise, poderia ser usada como uma manobra política, visando desviar o foco da atenção dos seus problemas internos. Portanto, devido a essa disputa geopolítica nas proximidades de Roraima, alertávamos que era importante que o governo brasileiro acompanhasse com atenção o desenrolar dos acontecimentos, e se preparasse adequadamente, ainda mais por termos uma reserva indígena, onde existem vários interesses extragovernamentais, nas proximidades da área em litígio;

  3. "O problema venezuelano parte II. O estreitamento de laços com o Irã", de 05 de dezembro de 2020, disponível em https://www.atitoxavier.com/post/o-problema-venezuelano-parte-ii-o-estreitamento-de-laços-com-o-irã, dentre várias análises realizadas por nós, dissemos que a cooperação militar entre o Irã e a Venezuela poderia contribuir para o aumento da instabilidade geopolítica na América do Sul, pois o governo venezuelano possuia a melhor defesa antiaérea do continente com o sistema russo S-300, e caso tivesse os drones iranianos colocaria o país em outro patamar militar, na região sulamericana, no tocante ao uso desse tipo de aeronave, que fez a diferença nos recentes conflitos, como os da Líbia, Síria e de Nagorno-Karabakh, bem como está fazendo na Guerra da Ucrânia, para os russos. Além disso, essa parceria tem sido fundamental para a manutenção do ditador venezuelano no poder. Assim, alertamos que o nosso país tinha que atentar para essa situação, melhorando a sua defesa antiaérea e investindo em drones, que são o futuro dos conflitos armados;

  4. "Tensão e conflito na região fronteiriça entre Venezuela e Colômbia", de 02 de maio de 2021, acessível em https://www.atitoxavier.com/post/tensão-e-conflito-na-região-fronteiriça-entre-venezuela-e-colômbia, realizamos várias análises sobre as tropas venezuelanas, e dissemos que o preparo das forças armadas venezuelanas era deficiente, bem como existiam vários relatos de deserções de suas fileiras, o que poderia explicar os casos de maus tratos à sua população na área de tensão, bem como o apelo governamental para a formação de milícias locais;

  5. "Forças russas na Venezuela - presença confirmada pelo Ministério da Defesa!", de 19 de maio de 2021, que pode ser lido em https://www.atitoxavier.com/post/forças-russas-na-venezuela-presença-confirmada-pelo-ministério-da-defesa, falamos sobre a parceria estratégica entre a Venezuela e a Rússia, e as confirmações oficiais do Ministério da Defesa brasileiro de que existiam tropas russas operando com as venezuelanas. Além disso, afirmamos que a presença do GRU (inteligência militar russa) operando na Venezuela e com isso tão próximo ao Brasil exigia cautela e atenção, recomendamos ler os artigos sobre os serviços de inteligência russa que estão disponíveis na Seção Inteligência no link https://www.atitoxavier.com/my-blog/categories/se%C3%A7%C3%A3o-intelig%C3%AAncia. Outrossim, alertamos que esse tema deveria ser acompanhado com atenção pelo governo brasileiro, especialmente pelos Ministério da Defesa, Ministério das Relações Exteriores e ABIN; e

  6. "Essequibo: disputa territorial entre Venezuela e Guiana. Parte II, de 24 de outubro de 2023, disponível em https://www.atitoxavier.com/post/essequibo-disputa-territorial-entre-venezuela-e-guiana-parte-ii, afirmamos que a postura assertiva da Venezuela, em nossa visão, tinha os seguintes objetivos: mostrar força para o público interno, pois haverá eleição presidencial em 2024; exercer pressão política no Tribunal Internacional de Justiça, que está analisando a disputa territorial sobre Essequibo, a fim de obter uma decisão favorável; e intimidar a Guiana, por meio da intenção do emprego do poder militar, para tentar realizar uma nova negociação sobre a região em disputa. Além disso, falamos que em que pese a Guiana ter um poderio militar insignificante, uma invasão militar venezuelana seria pouco provável, em nossa opinião, pelos seguintes motivos: a região de Essequibo é constituída por floresta densa, o que dificulta a mobilidade de veículos blindados e tanques. Além disso, a região não possui uma infraestrutura que possa ser usada pelos venezuelanos, como estradas; uma possível invasão pelo mar poderia ser impedida pela marinha dos EUA, que vem acompanhando a situação, bem como poderia cortar o apoio logístico marítimo a região invadida; uma alternativa seria uma invasão terrestre passando pelo Brasil - Roraima - o que seria um ato insano, pois não teria, smj, a permissão do Estado brasileiro; como a Guiana foi uma colônia britânica, haveria uma grande possibilidade de contar com o apoio inglês; e a Guiana tem se aproximado de Washington, muito devido a intimidação venezuelana, visando contar com o apoio estadunidense em caso de conflito com o regime de Maduro. Entretanto, apesar de acharmos pouco provável a hipótese de uma invasão militar venezuelana à Guiana, como estamos vivendo num mundo menos seguro e mais imprevisível, com dois grandes conflitos em andamento, como a Guerra da Ucrânia e a entre Israel e Hamas, não podemos desconsiderar totalmente essa possibilidade. Dessa forma, falamos que o Brasil tinha o dever de atuar como um moderador nessa questão, devido a proximidade da região disputada, bem como se possui a pretensão de se afirmar como um líder regional.


Ao olharmos atentamente as recentes "manobras" venezuelanas, como:

  • realizar plebiscito sobre a soberania de Essequibo;

  • oferecer cidadania venezuelana aos habitantes da região disputada;

  • aumentar o número de tropas nas proximidades da fronteira com a Guiana; e

  • apresentar um novo mapa com a região integrada à Venezuela, criando um novo estado venezuelano.

Podemos inferir que é muito semelhante ao que Putin fez com a Ucrânia, em relação as regiões de Donetsk e Lugansk.

Portanto, não acreditamos que seja uma coincidência o anúncio da viagem de Maduro a Rússia, para visitar o presidente Putin, surpreendendo e causando contrariedade no governo brasileiro, pois afinal o atual governo vem tentando diminuir as pressões internacionais sobre o regime venezuelano, por meio de uma possível reabilitação política da Venezuela no cenário internacional, notadamente na América do Sul.

Outrossim, uma consequência, esperada e alertada pelo Blog nos artigos acima, foi o anúncio pelos EUA sobre a realização de exercícios militares no terrítório guianês, conforme a nota abaixo, de 07 de dezembro, o que foi considerado pelos venezuelanos como uma provocação:


"In collaboration with the Guyana Defence Force (GDF), the U.S. Southern Command (USSOUTHCOM) will conduct flight operations within Guyana on December 7. This exercise builds upon routine engagement and operations to enhance security partnership between the United States and Guyana, and to strengthen regional cooperation. In addition to this exercise, USSOUTHCOM will continue its collaboration with the GDF in the areas of disaster preparedness, aerial and maritime security, and countering transnational criminal organizations. The U.S. will continue its commitment as Guyana’s trusted security partner and promoting regional cooperation and interoperability." (fonte: https://gy.usembassy.gov/southcom-to-conduct-flight-over-guyana/)


Além disso, uma outra nota da Embaixada dos EUA na Guiana, de 28 de novembro, já dava indícios que o governo de Washington começaria a interferir na disputa, o que na nossa visão se deve a irrelevante influência política brasileira sobre o atual regime venezuelano, que não está sendo capaz de mediar a crise:


"The leadership from the United States Army 1st Security Force Assistance Brigade (SFAB) and the Guyana Defense Force (GDF) met November 27-28 as part of the United States and Guyana’s strong military to military partnership. The U.S. and Guyana defense forces discussed upcoming engagements to include strategic planning sessions and processes to enhance both countries’ military readiness and capabilities to respond to security threats. The SFAB is a specialized unit of the U.S. Army established to advise and assist partner nations.  Since 2022, the SFAB has conducted several joint training exercises with the GDF to strengthen their capacity and capability at the tactical and operational levels. The SFAB Advisors stated, “We are thankful for the opportunity to train with the Guyana Defense Force as our partners and friends.  We look forward to deepening the partnership in the weeks and months to come.” GDF Staff Officer One General Three – Operations and Training – Lieutenant Colonel Andy Pompey said, “The last iteration of U.S. military training here in Guyana has been of tremendous benefit to the Medical Corps and the 4 Engineers Battalion.  The transfer of knowledge and expertise from our U.S. counterparts under the auspices of the SFAB has equipped our members with invaluable skills that are directly applicable to the dynamic nature of our modern security environment. As we witness the positive outcomes of this training, we are confident that the benefits will be enduring, impacting not only our force’s operational capabilities but also the professional growth of individual members.  The SFAB program, with its focus on enhancing the capabilities of partner forces, is a testament to the collaborative efforts between our nations.  We look forward to seeing the continued positive impact of the U.S. SFAB training on our force.” The U.S. and Guyana enjoy a longstanding security partnership marked by strong collaboration between SOUTHCOM and the GDF that is focused on disaster preparedness, humanitarian assistance, maritime security, human rights, professional development, defense and public-security missions, and countering transnational crime." (fonte: https://gy.usembassy.gov/u-s-army-guyana-defence-forces-strengthen-military-partnership/).


Com base no exposto, tecemos algumas considerações para reflexão do leitor:

  • o regime de Maduro, na sua Manobra de Crise junto à Guiana, está tendo apoio e orientação russa;

  • o Brasil não tem, atualmente, uma influência relevante sobre o regime venezuelano;

  • a Venezuela é o fator de instabilidade geopolítica da América do Sul;

  • a política externa brasileira não está conseguindo fazer do país um líder regional, o que permite com que potências exógenas a nossa região aumentem a sua influência nos países vizinhos, esvaziando a cada dia o nosso protagonismo;

  • uma possível consequência da consideração acima é que poderá ocorrer um aumento da militarização estrangeira no nosso Entorno Estratégico, com uma possível implementação de base militar estadunidense na Guiana. Não podemos esquecer da presença de forças estrangeiras na Venezuela; e

  • "miopia" estratégica brasileira, pois conforme verificamos nas análises dos artigos a Venezuela vinha dando indícios que daria origem a crises na América do Sul, notadamente na região de Essequibo, o que demonstra uma percepção de descaso do Poder Político com os assuntos de defesa e inteligência estratégica, bem como uma pouca prioridade em tornar o Brasil um líder regional, sendo prioridades a política interna e a promoção pessoal do líder do Poder Executivo, ou seja, existe a falta de uma Política de Estado.


Logo, podemos concluir que devemos mudar a nossa postura reativa para uma postura proativa, em que análises geopolíticas competentes, apoiadas uma boa assessoria da inteligência estratégica, permitirão com que façamos bons planejamentos estratégicos, que serão analisados e investigados pela realização de Jogos de Guerra, visando verificar vulnerabilidades e riscos, com o intuito de aprimorá-los.

Nesse cenário, o governo brasileiro começa, agora, a mostrar um esforço diplomático em mediar a crise, se oferecendo (não foi solicitado por ambas as partes) para atuar neste sentido. Além disso, somente após a escalada da crise é que planeja reforçar militarmente a região brasileira que faz fronteira com os envolvidos.

O Blog é de opinião que podemos ver, mais uma vez, o impacto da competição entre as grandes potências: Venezuela recebendo apoio russo e a Guiana sendo apoiada pelos EUA.

Assim, isso reforça o que sempre temos alertado, que vivemos num mundo mais imprevisível e menos seguro, e que abordamos no artigo "Mundo mais imprevisível e menos seguro. Precisamos nos preocupar?", disponível em https://www.atitoxavier.com/post/mundo-mais-imprevisível-e-menos-seguro-precisamos-nos-preocupar.

Qual a sua opinião?

Seguem alguns vídeos para ajudar a nossa análise:

Matéria de 09/12/2023:

Matéria de 08/12/2023:

Matéria de 07/12/2023:

Matéria de 07/12/2023:

Matéria de 08/12/2023:

Matéria de 08/12/2023:

Matéria de 06/12/2023:

Matéria de 05/12/2023:

Matéria de 08/12/2023:








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