Cerca de 95% do tráfego das telecomunicações mundiais é realizado por meio dos cabos submarinos, conforme podemos ver na figura acima, e podemos incluir nesse tráfego a maior parte da distribuição da internet, ou seja, é a espinha dorsal (backbone) da rede mundial de computadores. Com isso, vemos que eles são estratégicos e fundamentais para as comunicações.
Dessa forma, os dados governamentais e da maioria da população global, como redes sociais, e-mails, transações bancárias entre países, telefonemas para o exterior, informações de inteligência etc passam pelos cabos submarinos. Sendo assim, tal infraestrutura crítica tornou-se a melhor fonte de dados de inteligência para os Estados que desenvolveram a capacidade de obter dados, inclusive confidenciais, que transitam por esse meio de comunicação.
O acesso aos cabos submarinos possibilita também a realização de guerra cibernética, conforme podemos ver na matriz abaixo, onde as cores significam:
vermelha: ameaça de alto risco e gravidade;
amarela: ameaça de médio risco e gravidade;
verde: ameaça de baixo risco e gravidade.
Podemos inferir que quanto mais próximo da costa, maior será o grau de ameaça. E que em grandes profundidades teríamos a ameaça da espionagem cibernética, mas para tal faz-se necessário ter tecnologia específica para acessar os dados em águas profundas.
Nesse cenário, a Rússia e a China se apresentam como principais ameaças a segurança dos dados que trafegam pelos cabos submarinos, devido aos seguintes motivos:
Rússia: por meio do seu serviço de inteligência militar, GRU, tem tentado obter acesso aos cabos próximos da costa nos pontos que oferecem maior vulnerabilidade, com objetivo de espionar os países da Europa Ocidental. Além disso, possui o navio de pesquisa oceanográfico Yantar, que é utilizado para objetivos de inteligência, e acordo fontes de inteligência possui capacidade para realizar espionagem cibernética nos cabos submarinos. Tal navio sempre foi alvo de preocupação dos governos. Ademais, o governo russo vem desenvolvendo tecnologias submarinas através do uso de drones subaquáticos que poderiam ser transportados por submarinos e pelo Yantar para acessar os cabos submarinos, bem como por veículos operados remotamente - remotely operated vehicles (ROVs), que podem chegar até 6.000 metros de profundidade, e submersíveis que podem ser guarnecidos por mergulhadores de grandes profundidades. Alguns analistas de inteligência informam que os russos possuem um programa de emprego de baleias belugas para acessar os cabos, mas não existem maiores dados sobre isso, e por isso não achamos que seria confiável.
China: possui a empresa Huawei Marine, que é uma subsidiária da Huawey. A empresa é responsável pelo fornecimento e reparo de cerca de um quarto dos cabos submarinos no mundo, com isso poderia acessar os dados que trafegam nesses cabos. Em 2019, em meio da guerra de informação entre os EUA e a China sobre a espionagem da Huawei, a sua subsidiária foi vendida para Hengtong Optic-Electric, que por sinal é uma empresa chinesa que fabrica fibra ótica para a produção de cabos submarinos.
Além da Rússia e da China, os EUA também possuem capacidade para acessar os cabos submarinos e realizar ações citadas na matriz de risco .
Tais ameaças foram mencionadas em um artigo da Defense News, disponível em https://www.defensenews.com/opinion/commentary/2020/07/01/protecting-undersea-cables-must-be-made-a-national-security-priority/:
"Russia and China have developed capabilities in these areas. Russian submarine activity near undersea cables is well-documented: The Yantar, a Russian spy ship, carries mini-submersibles that can either sever or tap them. Russian activity often clusters around crucial, yet hard-to-reach cables because these are difficult to repair."
"Chinese officials view control of undersea infrastructure as part of a broader strategic competition for data. One official Chinese Communist Party outlet explained that “although undersea cable laying is a business, it is also a battlefield where information can be obtained.”
Nesse cenário, o Ministro da Defesa Britânico Ben Wallace anunciou que a Royal Navy está adquirindo um navio para realizar a vigilância subaquática e que será designado como Multi-Role Ocean Surveillance Ship - MROSS e que deve estar operacional em 2024, e cuja tarefa principal será realizar contrainteligência para assegurar a proteção dos seus cabos submarinos.
Isso demonstra o ciclo da inteligência e contrainteligência que usamos em nossos artigos dessa temática:
Convém mencionar que em caso de conflito os Estados que possuem tecnologia de acesso aos cabos submarinos podem cortá-los ou danificá-los, o que traria graves consequências aos governos afetados.
Alguns países têm realizado estudos para alternativas aos cabos submarinos e, até o momento, não há soluções de implementação em curto e médio prazos.
O Blog é de opinião de que os cabos submarinos são estratégicos e vulneráveis aos Estados que possuem tecnologia para acessá-los e danificá-los, o que poderá trazer sérias consequências aos governos que não têm meios de protegê-los adequadamente.
O nosso país como utiliza tal infraestrutura, e que não possui tecnologia para realizar a contrainteligência em relação aos cabos que utiliza, necessita avaliar o grau da criptografia empregada em suas informações governamentais sigilosas que trafegam por esse meio de comunicação, e deverá avaliar se aumentará o nível de segurança dos seus dados. visando dificultar a análise pelos possíveis oponentes. Além disso, deverá refletir sobre meios alternativos aos cabos submarinos.
Qual a sua opinião? Devemos nos preocupar com essa infraestrutura crítica?
Seguem alguns vídeos que podem nos ajudar em nossa reflexão:
Matéria de 05/09/2013:
Matéria de 21/02/2020:
Matéria de 09/04/2018:
Matéria de 16/04/2019:
Matéria de 29/10/2020:
Matéria de 15/12/2017:
Matéria de 18/12/2020:
Matéria de 19/10/2015:
Matéria de 09/04/2021:
Excelente esta matéria sobre a vulnerabilidade dos cabos submarinos... Parabéns, mais uma vez, ao autor!